O parto domiciliar planejado é tão seguro quanto o parto hospitalar. É o que apontou um uma metanálise internacional conduzida pela Universidade McMaster, em Ontário, no Canadá, e publicada pela revista The Lancet ‘s ClinicalMedicine.
A metanálise usou dados de 21 estudos publicados desde 1990, comparando resultados de aproximadamente 500 mil partos domiciliares com números semelhantes de nascimentos ocorridos em partos hospitalares em 8 países: Suécia, Nova Zelândia, Inglaterra, Holanda, Japão, Austrália, Canadá e Estados Unidos.
No Brasil, o parto domiciliar planejado (PDP) tem crescido cada vez mais, especialmente nas grandes cidades com o aumento da oferta de parto humanizado. Um estudo da Fiocruz que revisou a produção bibliográfica nacional entre os anos de 2008 e 2018, concluiu que “O Parto domiciliar planejado tem crescido entre parcelas privilegiadas da população, representando importante prática de exercício da autonomia da mulher em contraponto ao modelo obstétrico vigente, apresentando-se como alternativa segura de local de parto, com alto grau de satisfação para as mulheres e famílias”.
No entanto, existem alguns critérios que precisam ser adotados para garantir a segurança do parto domiciliar planejado. E é sobre eles que vamos conversar a seguir. Mas antes disso, quero ressaltar que o parto é um evento fisiológico e que precisamos resgatar esse entendimento que, ao longo dos anos e de todas as intervenções médicas, se perdeu.
Nosso corpo tem a função de gerar e trazer criança para o mundo, por meio do nosso útero. Nós, mulheres, somos o único meio de transporte da vida para a terra. Isso é muito potente, trata-se de uma sabedoria universal que está muito além do domínio médico.
Do lado oposto, vivemos em uma cultura que desacredita a força da mulher, uma cultura intervencionista que acredita (e nos faz acreditar) que tudo é patológico. Apresentado esse cenário, podemos conversar sobre a segurança no parto domiciliar.
Parto em casa é para gestação de baixo risco
Apenas 15% das gestantes vão desenvolver algo que precise de um pouco mais de atenção. Isso quer dizer que, de cada 100 mulheres, 15 vão apresentar alguma patologia que precisará ser acompanhada mais de perto e que, talvez, possa vir a precisar de uma cesárea.
No entanto, o que temos hoje em São Paulo, segundo dados do Sinasc, são hospitais privados com 85, 90% de cesarianas, ou seja, mesmo as mulheres de baixo risco estão sendo submetidas a cirurgias e intervenções necessárias que trazem mais riscos à elas, aos bebês e à futuras gestações.
Mulheres com qualquer risco fora do habitual não tem indicação de parir em casa. Isso não significa que mulheres com patologias (pressão alta na gestação, diabetes gestacional…) não possam ter parto normal, elas só não podem ter seus bebês em casa.
O risco pode ser detectado tanto na gestação quando ao longo do trabalho de parto. Por isso, é essencial que no parto em casa a mulher esteja acompanhada por profissionais experientes que façam a condução com base em evidência cientifica, sigam os critérios de forma rigorosa e saibam o que fazer caso o parto fuja da normalidade esperada. E é aí que surge a importância de se fazer um bom planejamento de parto.
Quanto menor o risco, mais chance de dar tudo certo o parto em casa
Mas, Karina, por que você fala em mais chance? Intercorrências no parto podem acontecer a qualquer momento. Parir envolve riscos, assim como tudo na vida. Quem escolhe parir em casa precisa ter ciência de que, caso surja uma intercorrência, talvez ela possa ser resolvida em casa ou seja preciso fazer a transferência de forma segura para um hospital mais próximo.
Uma transferência não significa cesárea, significa apenas que o ambiente hospitalar será mais seguro para aquele nascimento, que poderá ocorrer de forma natural, sem intercorrências, mudando apenas o local de parto.
Critérios para a segurança do parto domiciliar planejado
– Profissionais capacitados, com treinamento em urgência e emergência obstétrica e neonatal e com material adequado para o atendimento.
– Não é necessário ter uma ambulância na porta da casa, mas se isso trouxer tranquilidade à família, é possível.
– Distância segura entre a casa e o hospital de, no máximo, 15 minutos.
Qual o maior risco do parto em casa?
Para a mulher o maior risco é a hemorragia pós parto. Trata-se de um risco baixo, mas real. Para o bebê, o maior risco é nascer e não conseguir fazer as trocas ventilatórias. Importante lembrar que profissionais que atendem parto em casa são treinados para fazer a ventilação por pressão positiva.
O único procedimento que não fazemos em casa é intubar o bebê. Segundo as estatísticas, um em cada mil bebês pode precisar ser intubado. E se precisar, transferimos. Ah, Karina, mas eu posso ter um Pediatra no parto em casa? Isso vai te deixar mais tranquilo? O Pediatra tem material de entubação? É possível conversar e alinhar com a equipe.
Hospital oferece segurança. Será?
Para muitas mulheres e famílias o hospital será o local mais seguro para o parto, afinal, o melhor lugar para parir é onde a mulher se sinta confortável e segura. O que precisa pensar é se essa sensação de segurança é genuína ou se foi imposta, como crença.
O hospital até pode te dar a sensação de segurança mas você pode estar sendo acompanhada por profissionais que não tem habilidade técnica para atender parto normal e/ou para tratar o bebê com respeito e com intervenções apenas se necessário. Hoje já sabemos que intervenções sem necessidade podem levar ao agravamento de situações que seriam simples de lidar, se a conduta adotada fosse assertiva.
Quando ocorre alguma situação que foge da normalidade, ouço pessoas falarem: – “Nossa, ainda bem que fulana estava no hospital!” Criamos, assim a ideia de que a pessoa foi “salva” porque estava no ambiente hospitalar, quando na verdade não sabemos se ela estivesse em casa e não sofresse intervenções sem necessidade, talvez nem houvesse agravamento do quadro.
Quer um exemplo? Aspirar o bebê de rotina. Mesmo não tendo evidência científica que justifique a prática, ainda há muitos profissionais que fazem isso no hospital, podendo desencadear braquicardia e atrapalhar o processo ventilação.
O que quero dizer é que, no hospital, sem uma equipe humanizada, a mulher está muito mais exposta a intervenções do que estaria em um parto planejado domiciliar.
E aqui retomo a fala que iniciei lá no início: se acreditamos na fisiologia e na sabedoria do corpo, parir em casa se torna uma experiência mais segura, com muito mais respeito, menos intervenções, mais entendimento, mais espera e paciência para que o processo natural do corpo aconteça.
E por fim, se você deseja parir em casa, minha dica é: planeje, busque uma equipe que te passe segurança, pergunte TUDO, exatamente TUDO. Entenda que a família e a equipe assumem um risco juntas, afinal, parto domiciliar é seguro, mas não é ausente de risco, assim como nada nessa vida.
Texto: Karina Fernandes Trevisan