Parir dói – e dói muito. Desconfie de quem diga que existe parto completamente sem dor. Parir dói mas se trata de um processo fisiológico do nosso corpo! Durante a gestação, tudo está ali, fechadinho para segurar o bebê e, de repente, esse corpo precisa se abrir para permitir sua passagem. São as contrações do útero que ajudam a empurrar o bebê pra baixo e abrir o colo do útero, e esse é um processo muito intenso feito pelo corpo, no qual todo o nosso organismo participa e se empenha, se ajustando para permitir essa passagem.
Para o bebê, as contrações são como um abraço forte, que promovem estímulos pra que o seu sistema nervoso vá “acordando” para o que ele vivenciará no parto e na vida fora do útero ( respirar, chorar, mamar…). Essa é uma das razões pelas quais reforçamos que o trabalho de parto sempre será benéfico para a mãe e para o bebê. É muito comum mulheres que estiveram em trabalho de parto e, por alguma razão, precisaram de uma cesárea, ouvirem: – “Nossa, coitada! Nadou, nadou e morreu na praia. Era melhor ter ido direto para a cesárea”. Não, não era melhor. Não existe “nadou, nadou e morreu na praia”, porque além dos benefícios para o bebê – mencionados acima, passar pelo trabalho de parto, vivenciar as contrações, ajuda a acordar os sistemas da mulher para tudo o que ela também vivenciará no pós-parto, como o retorno uterino, a descida do leite, o vínculo com o bebê…). Na grande maioria das gestações, salvo raras exceções, sempre vale a pena aguardar o trabalho de parto, independente se o desfecho for parto normal ou cesárea!
Dor é diferente de sofrimento
O primeiro exercício que precisamos fazer é desassociar a palavra “sofrimento” da palavra “parto”. Dor é uma coisa, sofrimento é outro. Elas podem sim estar relacionadas mas nem sempre estarão (e, aliás, nunca deveriam estar). Sofrimento é ser maltratada no parto, ter sua dor silenciada, não ser ouvida, não ser acolhida, ser violentada. Dor é outra coisa.
Deixa eu fazer uma analogia aqui para você. Quando fazemos uma tatuagem, uma depilação, uma maquiagem definitiva… aquilo que sentimos durante o processo é uma dor ou um sofrimento? Onde aquela dor irá te levar? Quais os aprendizados desse processo? Qual será o resultado? A dor é parte do processo.
Vivemos em uma sociedade na qual, cada vez mais, deixamos de sentir pois todos os processos podem ser acelerados. E nessa busca incessante pelo mais rápido, a pergunta é: quanto estamos abrindo mão de sentir? Quando deixamos de sentir, perdemos muita coisa. Sentir nosso corpo vivo, perfeito, trabalhando. Poder olhar para esse processo com a mágica que ele é e não como um lugar de sofrimento. Parir não nos dá força, mas nos faz acessar a força que já existe dentro de nós. Como o meu corpo é capaz de fazer isso? Acessar esse lugar é descobrir que o nosso corpo é potente e capaz de fazer tudo que a nossa cabeça permitir que ele faça.
Como se preparar?
– Se informe, pesquise, estude, converse com outras mulheres que pariram: informação no pré-natal faz muita diferença!
– Se possível, participe de grupos de gestantes;
– Conheça histórias de mulheres que venceram seus medos.
– Prepare seu emocional. Técnicas de Hipnobirthing, Gentebirth (exercícios de meditação guiada para gestação e parto), técnicas de respiração da yoga (…). Cada mulher vai achar seu ponto de apoio e de equilíbrio.
– Tente se conectar com o medo, não fuja dele. Eu tenho medo do quê exatamente? Que medo é esse? Anote em um papel! No parto acessamos medos inconscientes por isso é importante nos conhecer e fazer esse trabalho interior.
Como aliviar essa dor?
Uma dor acolhida é muito diferente de uma dor vivida sozinha. Se possível, esteja cercada de pessoas que a acolham, que cuidem de você. De forma prática, o calor traz conforto para as contrações (chuveiro, bolsa quente de ervas, banheira, massagem…). Além disso, temos como recurso o uso da homeopatia, acupuntura, exercícios de alongamento para ajudar no posicionamento (o que reduz a dor). Estudos comprovam que o suporte contínuo de uma Doula melhora a experiência em relação à dor: massagem na lombar, pressão no quadril, pressão nas costas… cada mulher vai lidar de uma maneira, por isso o ideal é que o profissional que a acompanhe vá testando os métodos de alívio de forma individual.
Alguns hospitais possuem estrutura para oferecer esses métodos, outros não. É sempre bom se informar sobre esses recursos, como é a entrada da doula, o que é permitido e o que não é. Em São Paulo, a entrada da Doula é lei, em outros estados, não. Ainda assim, sabemos que mesmo em SP alguns hospitais descumprem a lei, então o ideal é sempre perguntar.
Posso usar anestesia no parto normal?
A analgesia de parto é um recurso possível, mas infelizmente disponível apenas na rede privada. Os hospitais públicos não têm material e nem profissionais disponíveis para fazer analgesia quando solicitado (apesar de seu uso ser descrito como um direito reprodutivo das mulheres nos materiais do Ministério da Saúde).
É importante saber que a analgesia agrega riscos para o parto e, a partir dessas informações, decidir o quanto vale a pena utilizar o recurso. A anestesia pode ser peridural ou raqui e o ideal é que seja feita após os 6 cm de dilatação que é quando inicia a fase ativa do parto. Só pode ser feita no hospital pois é um procedimento invasivo e requer monitoramento criterioso de mãe e bebê.
Alguns dos riscos da analgesia:
– Pode baixar a pressão arterial da mulher e, por consequência, afetar o bebê.
– Pode diminuir a intensidade das contrações e fazer com que a mulher venha a precisar de ocitocina. A ocitocina sintética, por sua vez, pode levar a contrações mais fortes e longas, que podem provocar queda dos batimentos cardíacos do bebê, sendo necessárias mais intervenções.
– Por ser necessário o monitoramento após a aplicação, a analgesia reduz a movimentação da mulher (dificultando e evolução do trabalho de parto em si).
– Inviabiliza o parto na água.
– Alguns anestesistas não permitem que a mulher se alimente, nem ingira líquidos após a analgesia.
– A analgesia aumenta o risco de a mulher não conseguir fazer força adequada, sendo necessário a força guiada, sem sentir o puxo, podendo desencadear a necessidade do uso do fórceps ou do vácuo para auxiliar a saída do bebê.
Lembre-se: conhecer todos os benefícios e os riscos de cada prática nos empodera para fazermos escolhas conscientes para nós e para o nosso bebê, não somente no parto, mas durante toda a vida.
Thaís Rodrigues Bernardo é Enfermeira Obstetra, Parteira Urbana e idealizadora do Curso Parto sem Neura